Governador mira no Judiciário para conquistar eleitores críticos ao sistema

No mundo da política, as palavras são armas. Bem utilizadas, podem conquistar corações e mentes; mal manejadas, podem causar estragos irreparáveis. O recente ataque do governador Mauro Mendes ao Tribunal de Justiça de Mato Grosso, ao sugerir o uso de câmeras corporais em juízes e desembargadores para coibir a venda de sentenças, é um exemplo claro de como o discurso público pode ser moldado para atender interesses específicos, ainda que à custa da harmonia institucional.

A reação foi imediata e enérgica. O presidente do Tribunal de Justiça, desembargador José Zuquim, respondeu com indignação e veemência, defendendo a honra da Justiça estadual. Na mesma linha, a Associação dos Magistrados de Mato Grosso (Amam) publicou uma nota contundente, rechaçando as insinuações e reafirmando o compromisso do Judiciário com a ética e a legalidade. O episódio trouxe à tona uma tensão que não é nova, mas que ganhou contornos mais graves por se tratar de uma crítica tão pública quanto infundada.

O que parece, à primeira vista, uma declaração intempestiva do governador é, na verdade, um cálculo político cuidadosamente arquitetado. Mauro Mendes, ao mirar o Judiciário estadual, não estava apenas atacando uma instituição, mas dialogando diretamente com uma parcela do eleitorado que vibra com discursos inflamados contra o sistema de Justiça brasileiro, especialmente o Supremo Tribunal Federal. Essa estratégia, que busca polarizar e mobilizar, é um recurso comum em tempos de pré-campanha eleitoral.

E não é segredo para ninguém que Mendes já vislumbra a cadeira de senador em 2026. Para isso, ele precisa ampliar sua base eleitoral, capturando o apoio de setores mais conservadores e críticos às instituições. Ao transformar a Justiça em alvo, o governador reforça sua imagem como alguém disposto a desafiar o “status quo”, alimentando uma narrativa que ressoa bem em determinados segmentos da sociedade.

Entretanto, esse tipo de ataque tem um custo elevado. Quando um chefe do Executivo estadual coloca em xeque a idoneidade do Judiciário, abala-se não apenas a relação entre os Poderes, mas também a confiança da população nas instituições que deveriam servir de pilar para a democracia. É uma escolha arriscada, que pode render dividendos eleitorais, mas que compromete a estabilidade do sistema republicano.

A fala de Mauro Mendes é um lembrete de que, em política, raramente há ingenuidade. Tudo é calculado, tudo é medido. Aparentemente, ele aposta que o desgaste momentâneo com o Judiciário será compensado pela adesão de um eleitorado que enxerga as instituições como inimigas. Resta saber até que ponto essa estratégia será eficaz ou se acabará gerando mais ruído do que resultados concretos.

No fim, o episódio é um chamado à reflexão. Precisamos, como sociedade, questionar qual o limite aceitável para a politização do discurso institucional. A crítica ao Judiciário, quando fundamentada e construtiva, é válida e necessária. Mas usá-la como trampolim eleitoral é perigoso. A democracia, afinal, não sobrevive sem instituições sólidas e respeitadas – e a retórica inflamada de hoje pode se tornar o caos de amanhã.

Marco Polo de Freitas Pinheiro Gestor Publico e jornalista

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